(Actualizado a 4 de Setembro de 2020)
Setembro é o melhor mês para uma viagem às vindimas no Douro, para participar desde o corte até à pisa da uva no lagar, com paragens em duas prestigiadas quintas: a Quinta do Vallado, em Vilarinho dos Freires (Régua) e a Quinta da Pacheca, em Cambre (Lamego). O cenário desta viagem é o da região vinícola demarcada mais antiga do mundo (1756), com uma tradição de produção de vinhos de mais de 2.000 anos, de que se destaca a arte de criação do vinho do Porto. Pelo seu legado e beleza a UNESCO distinguiu-a como Património da Humanidade em 2001.
Do Porto ao Douro
A melhor maneira de ir do Porto até às quintas do Douro é de carro, pois conseguimos chegar exactamente onde queremos ir, aproveitando a viagem ao melhor ritmo. Conduzi pelas montanhas do Alto Douro, já com as cores de outono nas videiras plantadas em socalcos. Após uma hora e meia de viagem, chegávamos à nossa primeira paragem.
A Quinta do Vallado, já com 300 anos de existência, faz parte do património da família Ferreira desde 1818, altura em que o tio de D. Antónia Adelaide Ferreira a adquiriu. Tomás Carvalho, especialista em vinhos, é quem recebe para uma visita pela Quinta.
Começámos por aprender a distinguir algumas castas de uva, não só pelo fruto, como também pelas folhas. Das mais de 30 castas cultivadas no Vallado, 92% destinam-se à produção de Vinho do Douro D.O.C., e apenas o restante é usado para Vinho do Porto. Para se ter uma melhor ideia da riqueza da região demarcada do Douro, há que saber que nela se cultivam mais de 80 castas. A região está dividida em três zonas distintas: Baixo Corgo, Cima Corgo e Douro Superior, todas com diferentes características no solo e nas condições climatéricas. O Baixo Corgo, onde se situa esta viagem, tem uma altitude mais baixa e os seus vinhos são mais elegantes e com menos taninos.
O corte das videiras é feito entre Janeiro e Fevereiro e há sempre o cuidado de deixar algumas vides (varas de videira), que vão abrolhar (lançar novos rebentos) em Março. Durante o Verão as uvas ganham cor, aroma e paladar. Em Setembro e Outubro, quando o peso, cor e acidez das uvas já têm as condições ideais para a produção do vinho, é feita a vindima.
Este ano as vindimas começaram mais cedo, com as vinhas coloridas a sublimarem o azul do céu solarengo.
As uvas apanhadas são depois seleccionadas e desengançadas, de modo a separar os bagos, que seguem então para o lagar. Da pisa (lagarada) resulta uma maceração gentil, que não racha nem esmaga as sementes das uvas, pois tal liberta sabores amargos para o mosto. Os pés humanos são a ferramenta ideal para esta tarefa, difícil de replicar pelos sistemas automáticos.
Eu queria mesmo fazer uma lagarada tradicional, para reviver a que fizera em pequena na quinta do meu bisavô em de Ponte de Lima. Nem todas as quintas estão preparadas para receber visitantes na pisa de uva, mas há uma que o faz como ninguém: a Quinta da Pacheca.
Situada em Lamego, a Quinta da Pacheca, uma das quintas mais antigas do Douro (1738), foi adquirida pela família Pimentel há 113 anos, altura em que se replantou toda a vinha. Tem um cariz muito tradicional e orgulha-se de ter sido a primeira quinta a engarrafar vinho tintos de marca própria. Com uma acolhedora equipa especializada em enoturismo, tem sido cada vez mais procurada pela sua oferta de experiências ligadas ao vinho.
A Quinta da Pacheca tem um lagar luminoso que mantém a sua arquitectura original, o que o torna especialmente charmoso. Ao entrar no lagar, guiada pelo simpático Carlos Pereira, senti-me logo enebriada por um suave aroma de vinho novo. Um tanque de 12 toneladas de uva que já havia subido à superfície durante a noite, esperava pelos meus pés.
Enquanto pisava as uvas, dois pisadores genuínos davam instruções sobre como se faz uma lagarada bem feita: “De braço dado! Com ritmo!…”. Só faltaram mesmo as cantigas das vindimas.
Os pisadores trabalham em turnos de 2 a 3 horas por dia. Nós ficámos alguns 20 minutos a pisar as uvas e não queríamos sair. É uma sensação agradável a da lagarada. As uvas são macias, o mosto que sentimos nos pés refresca. Durante o resto do dia senti a pele muito suave, graças aos antioxidantes que abundam nas uvas.
Do esmagamento das uvas resulta o mosto, o líquido que após o processo de fermentação se transforma em vinho. No caso dos vinhos de mesa, a fermentação segue o ciclo completo e prolonga-se durante 2 a 3 dias para se obter um vinho seco. Já no caso do Vinho do Porto a fermentação é interrompida a meio e adiciona-se aguardente vínica. O vinho passa ainda por um cuidadoso processo de filtragem.
No final do processo de fermentação, o vinho é armazenado em depósitos de madeira, cimento ou inox até estar próprio para consumo.
A adega visitável da Quinta da Pacheca, onde também se organizam eventos, é do século XIX e no Verão, quando no exterior a temperatura chega aos 45ºC, o piso é regado para manter o ar mais fresco na cave. Nela se conservam grandes tonéis com capacidade para 33.000 litros de vinho. Reparem na inscrição “PPS 30” no tonel aqui fotogrado – significa que para o encher são necessárias 30 barricas ou pipas.
Na Quinta do Vallado, por sua vez, existe uma moderna sala de barricas que as mantém a uma temperatura sempre constante. As barricas de carvalho, constantemente micro-oxigenadas, acalmam e arredondam os taninos, tornando-os aveludados e trazendo corpo.
As barricas são utilizadas durante 6 a 7 anos para o estágio dos vinhos de mesa e durante mais alguns anos para os vinhos do Porto. Depois disso, como explicou Tomás Carvalho, apesar de continuarem aptas para o vinho, há um maior risco de perda de intensidade dos aromas da madeira, entre outros factores, pelo que são vendidas para o envelhecimento de aguardentes e whisky puro malte.
Os vinhos de mesa só chegam ao mercado dois anos após a colheita, após o envelhecimento e o engarrafamento. De modo que se quiserem provar o vinho que eu ajudei a pisar, ainda têm que esperar algum tempo, mas garanto-vos que vai valer a pena!
Além dos programas de enoturismo e das provas de vinho a Quinta da Pacheca conta ainda com um restaurante do Wine House Hotel, um espaço de deleite que podem conhecer melhor aqui. Depois das provas de vinho nessa manhã e de um jantar muito gourmand, a minha noite terminou da melhor maneira no The Wine House Hotel. Com opções destas, viver o Douro nas vindimas é comprovar que este é um destino de viagem que não se esgota.
Como Chegar: A melhor forma de chegar directamente às quintas, com a liberdade de parar para admirar as paisagens do Douro, é ir de Automóvel, seguindo as indicações nos sites das quintas.
Pode alugar um automóvel da Guerin, Car Rental Solutions no aeroporto ou na cidade.
Visitas às Quintas e Enoturismo no Douro:
Quinta da Pacheca
Quinta do Vallado
Onde almoçar/jantar: Restaurante Wine House Hotel Quinta da Pacheca
Onde dormir: Wine House Hotel Quinta da Pacheca
Este artigo faz parte de uma série de três artigos que escrevi sobre as VINDIMAS NO DOURO.
Veja aqui os outros:
The Wine House Hotel Quinta da Pacheca
Nota da autora: A minha viagem às vindimas no Douro contou com o apoio da Quinta da Pacheca, da Guerin e da Quinta do Vallado. As opiniões aqui expressas são inteiramente minhas.