Vera Dantas e Manuel de Novaes Cabral no IVDP

O presidente do Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, Manuel de Novaes Cabral, recebeu o Porto Envolto no seu escritório deste instituto, responsável  por controlar todo o processo de análises e certificação dos Vinhos do Porto e do Douro (ver o meu artigo aqui). Na sua secretária, uma garrafa de Vinho do Porto com rótulo Joana Vasconcelos – Trafaria Praia, aberta a fogo com tenaz, fazia prova da aliança entre tradição e criatividade. O Vinho do Porto, pela sua história e altíssima qualidade, faz já parte da identidade do Norte de Portugal, mas ainda não é conhecido na proporção devida. O IVDP está a trabalhar para que isso mude, apostando na formação dos intermediários de consumo – a harmonização, a temperatura e o copo adequados são três factores que não se podem descurar na altura de servir um “Porto”.

O presidente do IVDP conta que há uma procura crescente pelas categorias especiais de Vinho do Porto e realça que pela primeira vez uma única região vitivinícola (a do Douro) alcançou três dos quatro primeiros lugares na prestigiada lista da Wine Spectator dos Top 100 mundiais. O primeiro lugar é do DOW’s Port. O Vinho do Porto e o Douro Vinhateiro vivem uma fase muito positiva que importa conhecer.

Manuel de Novaes Cabral entrevistado por Vera Dantas

Vera Dantas: Uma das importantes funções do IVDP é promover o grau de conhecimento do Vinho do Porto. Este vinho é hoje internacionalmente conhecido?

Manuel de Novaes Cabral: O Vinho do Porto é genericamente reconhecido, estamos em 120 marcados/países, o que é estar praticamente em todo o mundo. Mas os 10 primeiros mercados absorvem 93% da comercialização – são oito da Europa e apenas dois fora da Europa. Isto significa que se está com 7% de 310 milhões de euros no resto do mundo.Os 10 primeiros mercados do Vinho do Porto, por valor, são: França, Portugal, Reino Unido, Holanda, Bélgica, EUA, Canadá, Alemanha, Dinamarca e Espanha.

O Vinho do Porto é uma ideia que uma grande parte das pessoas reconhece mas muitas vezes não conhece. Há muito trabalho a fazer pelo mundo fora no sentido de mostrar o que é.

Em Portugal, nas regiões vitícolas, grande parte da comercialização é feita na região e no próprio país. A região do Vinho do Porto é quase certamente a única região vitícola que exporta 85% da sua comercialização. Isto tem a ver com razões históricas, pelo facto de o vinho ter sido comercializado pelos ingleses. O próprio IVDP está muito vocacionado para a exportação, explora muito pouco o mercado português.

V.D.: E que medidas é que o IVDP tem vindo a promover no sentido de melhorar o conhecimento do Vinho do Porto?

M.N.C.:  Porque estamos numa plataforma muito baixa em termos do reconhecimento do Vinho do Porto, quando cheguei ao IVDP iniciámos um processo que se mantém e tem que se reforçar, Saber Servir, Vender Melhor – destinado à restauração, às pessoas que são os intermediários do consumo, que estão no Canal Eureka. Consiste numa formação básica sobre o que é a região Demarcada do Vinho do Porto, quais são as características do vinho, quais as harmonizações mais adequadas para o mesmo.

Muitas vezes, embora cada vez menos, quando um turista das caves de Gaia pede um Vinho do Porto, não lhe é servido o vinho adequado ao momento, às harmonizações, à temperatura e nos copos adequados e tudo isto tem importância. Este problema resolve-se com formação. Colaboramos com escolas de hotelaria. Ainda estamos na formação básica, que várias pessoas pedem para repetir, o que é significativo do nível baixo em que nos encontramos. Há um trabalho muito grande a fazer no qual nos temos empenhado sempre com o apoio das empresas.

Manuel de Novaes Cabral entrevistado por Vera Dantas

V.D.: O evento “Porto Wine Day”, que teve estreia no ano passado, vai repetir-se este ano?

M.N.C.: O Dia do Vinho do Porto é a 10 de Setembro pois foi o dia da criação da Companhia Geral de Agricultura das Vinhas do Alto Douro. No ano passado foi uma experiência, em que se focou o Vinho do Porto e o Oriente.  Este ano queremos sedimentar o dia e vamos convidar os jornalistas a fazer visitas ao Douro, às quintas. Dia 11 Setembro vamos fazer um seminário sobre “O Papel do Vinho na Economia”, vocacionado para a defesa das Denominações de Origem por parte do IVDP.

V.D.: Afinal quantos Vinhos do Porto existem?

M.N.C.: Não sabemos, é impossível. Existem comerciantes que podem comprar uvas a produtores e fazer vários vinhos. Os produtores, cerca de 300, têm que fazer o seu vinho com as uvas das suas propriedades, pelo que lançam menos vinhos. Os comerciantes, menos de 100, têm uma capacidade e uma perspectiva de crescimento muito maior pois podem adquirir uvas aos viticultores.

Depois há a questão das marcas. As empresas fazem lotes. Todos os vinhos são provados no IVDP. Este aprova um lote, que pode dar lugar a 10 marcas. O Instituto tem um grande nível de controlo da exportação, até à unidade de garrafa. A mesma empresa pode ter um vinho que vai dar origem a determinado número de garrafas de outra marca. Nos vinhos do Douro quase diariamente são aprovados rótulospode haver vários da mesma marca e várias marcas da mesma empresa. É um número muito volátil.

V.D.: A produção na Região Demarcada do Douro tem vindo a crescer?

M.N.C.: A Região Demarcada do Douro tem 250 mil hectares. Destes, 44 mil hectares são de vinha, dos quais 42 mil hectares estão aptos a produção do Vinho do Porto. O Douro Vinhateiro, paisagem cultural evolutiva e viva, são 25.000 hectares.

Neste momento o Douro tem sobreprodução. O Vinho do Porto tem limitações na origem, das quais a primeira é o benefício, ou seja, o número de pipas que pode ser beneficiado ou transformado em Vinho do Porto com a adição de aguardente num determinado momento da fermentação para a parar e reter o grau de doçura considerado adequado, o que tem muito a ver com o enólogo que está a fazer o vinho. Em cada ano, até ao dia 31 de Julho, o IVDP define qual é o número de pipas que se pode produzir. Na última vindima o número foi 105 mil pipas de 550 litros, são as pipas de mosto (da Região Demarcada do Douro) – depois de adicionar aguardente ao mosto, o número aumenta.

O Vinho do Douro de Denominação de Origem (DO), em termos de valor, é um terço do Vinho do Porto (realidade pluricentenária, em oposição à realidade recente de poucas dezenas de anos do vinho do Douro). O vinho do Douro pode fazer o que quiser em função do mercado. Depois há ainda os espumantes e o moscatel, uma realidade muito importante dos vinhos com DO Douro.

Há ainda os Vinhos com Indicação Geográfica e o vinho de mesa, hoje apenas designado como “vinho” segundo a nomenclatura europeia,  que está sob a alçada do Instituto da Vinha e do Vinho.

V.D.: Perante tanta diversidade, como escolher um Vinho do Porto para degustar?

M.N.C.: O Vinho do Porto pela sua antiguidade e complexidade evoluiu muito e tem basicamente duas grandes famílias: os rubis e os Tawny e também os Brancos e os Rosés. Os Rosés existem há menos de 10 anos. Dentro dos rubis há os Vintage, os Late Bottled Vintage (LBV). Os Tawny têm imensas personalidades, com indicação de idade (10, 20, 30, 40 ou mais anos), de colheita. Cada qual tem a sua individualidade.

Com um queijo da serra combina bem um LBV ou um Vintage. Com um aperitivo, um Rosé ou um Branco. Uma sobremesa com ovos combina muito bem com um Tawny com indicação de idade ou um Branco velho. Mas o ideal é ter vários Vinhos do Porto à frente para, com amigos, fazer exercícios de harmonização.

V.D.: A procura do Vinho do Porto tem vindo a aumentar?

M.N.C.: Teve um crescimento muito grande entre 1995 e 2000 e um decréscimo daí até 2010. De 2010 em diante tem tido estabilidade na linha de comercialização, estando a acontecer aquilo que para as empresas é mais importante que é uma valorização do produto. A quantidade é estável e o valor sobe, mas muito ligeiramente. Há uma procura crescente das categorias especiais (vinhos com mais valor acrescentado, mais antigos, LBVs, Vintage) representam 20% da quantidade e 40% do valor da totalidade da comercialização do Vinho do Porto. As categorias especiais têm vindo a subir na quota de comercialização global do Vinho do Porto e é nesse sentido que vai o esforço do IVDP e das empresas.

V.D.: Podemos então concluir que a Região Demarcada do Douro vive uma fase positiva?

M.N.C.: Muito positiva. Os vinhos do Douro estão a crescer a dois dígitos.  A Wine Spectator, que tem uma importância brutal na projecção dos vinhos, lança a lista dos melhores 100 vinhos do ano a nível mundial – em 2014, entre os quatro primeiros prémios, três são do Douro. É a primeira vez que uma região vitivinícola do mundo tem três vinhos nos quatro primeiros lugares. E são todos de 2011: O primeiro lugar é do DOW’s Port (Vinho do Porto), o 3º lugar do Prats & Symington Douro Chryseia e o 4º do Quinta do Vale Meão Douro (estes dois, vinhos do Douro).

Isto desperta o interesse pelos vinhos e pela região no seu todo mesmo ao nível turístico. Porque o vinho é o elemento matricial da região vitivinícola do Douro.

Manuel de Novaes Cabral,   Vera Dantas  e Carla Fonseca, Responsável de Comunicação e Promoção do IVDP. Ao centro, retrato do Barão de Forrester

Manuel de Novaes Cabral, Vera Dantas e Carla Fonseca, Responsável de Comunicação e Promoção do IVDP. Ao centro, retrato do Barão de Forrester.