Texto: Vera Dantas
Fotografias: Vera Dantas
Fotografias de golfinhos: Natália Pérez e Picos de Aventura
Nada nos prepara para uma experiência como esta. Podemos saber o que está previsto, ter as melhores expectativas, sentir euforia por antecipação e até algum receio por irmos mergulhar em alto mar, mas só lá, no momento em que tudo se concretiza, é que realmente sentimos o que significa nadar com golfinhos em liberdade nos Açores.
Vou reviver por muito tempo aqueles momentos, quase inimagináveis, do meu mergulho na dimensão azul. Quando abri os olhos debaixo de água e espreitei, por breve momentos, o meio que é o dos golfinhos, senti-me verdadeiramente privilegiada e grata por aqueles seres meigos me deixarem nadar como eles. Sim, é mesmo isto, fui nadar com golfinhos ao largo da Ilha de São Miguel, nos Açores, com a Picos de Aventura – não teria sido possível fazê-lo sozinha e, garanto-vos, não poderia ter tido melhor experiência. Já tinha nadado ao lado destes mamíferos fabulosos há muito tempo nos Açores e claro que gostei, mas desta vez tive uma experiência muito mais completa, sobretudo graças à forma como a equipa que me levou soube aproveitar cada momento. Eis como se passou esta pequena e inesquecível aventura aquática numa manhã de Setembro.
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Da marina de Ponta Delgada ao alto mar
Foi num dia de férias de verão em família. Éramos dois adultos – eu e o Nuno – e as nossas duas crianças – o Artur, pequeno aventureiro de 9 anos, e o Luís, recém-adolescente muito bem humorado de 13. Fomos recebidos na sede da Picos de Aventura na Marina de Ponta Delgada pela bióloga marinha Natália Pérez, que trocou a sua terra natal, Tenerife, nas Canárias, um pouco mais a Sul dos Açores, pela ilha de São Miguel. Aqui está o mais próxima possível da sua paixão e área de estudo: os cetáceos. Foi Natália quem nos fez um pequeno briefing de como deveríamos agir durante a viagem para podermos mergulhar a tempo de aproveitar a proximidade dos golfinhos selvagens, cumprindo as normas de segurança em alto mar e, claro, respeitando o ritmo e a vontade destes animais livres. Incutiu-nos também confiança, já que iria estar connosco em toda a experiência.
Tínhamos chegado na segunda-feira à ilha mas dada a instabilidade do mar nessa semana, a Picos fez-nos uma pré-reserva para a manhã de domingo, altura em que se previam melhores condições meteorológicas, o que se confirmou. A Natália disse-nos logo que estava um dia óptimo para entrar na água do mar, que registava uns apetecíveis 24 ºC, pelo que não precisaríamos de fato de mergulho, que estão disponíveis em todos os tamanhos quando são necessários, assim como máscaras de mergulho. Como todos tínhamos máscaras de mergulho nossas, apenas eu precisei de pedir uma. Não quis tubo de snorkeling para não me preocupar em expelir constantemente a água do tubo. E ainda bem que o fiz, pois assim pude ouvir e ver melhor os golfinhos debaixo de água.
Todos sabemos nadar e no alto mar flutua-se com facilidade, mas o Artur ainda não se aguenta muito tempo por isso iria nadar com o colete de salva-vidas colocado. Para a viagem, toda a família vestiu os obrigatórios coletes salva-vidas. Depois, para não arrefecermos com o vento, foram-nos cedidos casacos impermeáveis para vestirmos no barco até à hora de nadarmos. Saímos com a Natália em direcção ao cais, onde o capitão Rodrigo já nos esperava, a bordo do SIR DINHA – curiosamente a fazer lembrar o nome do peixe que está na base da alimentação dos golfinhos nas costas portuguesas. Tínhamos o barco só para nós, o que foi mesmo excepcional. Seja como for, os barcos semi-rígidos da Picos de Aventura destinados a esta experiência têm sempre uma lotação máxima de 8 pessoas e a sua dimensão permite não só uma aproximação ao nível dos golfinhos, como também mergulhar com eles!
Pouco antes, saíra outro barco da Picos, mas apenas para visionamento de cetáceos. Nós, portanto, sentimo-nos muito especiais.
Seguindo o rasto dos golfinhos
O barco afasta-se da marina e começa a breve viagem. A Picos de Aventura conta com o apoio de um vigia na costa que, munido de um binóculo potente, procura os golfinhos (e baleias, para as experiências de whale watching) e dá indicações ao capitão do barco que assim se dirige para os locais do avistamento. Todos os dias são diferentes e o destino é sempre uma surpresa. Afinal, somos apenas exploradores de um mundo aquático que vive num espaço e tempo próprios.
Mas o que é bom é que aqui é quase impossível não ver golfinhos – a percentagem de avistamentos nas saídas é de 98 a 99%! Os Açores são de facto um dos melhores locais do mundo para a observação de cetáceos, graças à sua localização em plena rota de espécies migratórias. E não são apenas os animais que estão de viagem que podemos ver. Durante todo o ano, quatro espécies residem ao largo do nosso maior arquipélago: os golfinhos comuns, os roazes e de risso e também os grandes cachalotes. Ao todo, são 26 as espécies de cetáceos que se podem vislumbrar ao longo do ano nas ilhas açorianas.
A aproximação aos golfinhos selvagens
Naquela manhã o vigia da Picos de Aventura localizou dois grupos de golfinhos e nós fomos ao seu encontro. A nossa não era a única embarcação na área. A presença de catamarãs por vezes atrai os golfinhos que se colocam à frente da proa para aproveitarem o impulso gerado pelo andamento do barco. A “nossa” bióloga identifica logo a espécie que estamos a ver: são golfinhos comuns, muito bonitos. Pequenos, se comparados com outras espécies, subdividem-se entre os de bico comprido e os de bico curto (que são residentes nos Açores). Têm uma coloração bem definida que os distingue: dorso negro sob uma mancha amarelada de ambos os lados, ventre branco e mancha cinzenta junta à cauda. Medem até 2,5 metros de comprimento e pesam entre 70 e 130 kilogramas. São muito sociáveis e podem integrar grupos de até 500 indivíduos. E também curiosos, para nossa sorte, que os gostamos de os ver bem de perto.
Em harmonia com o mar e o dia, os dois grupos de golfinhos, estavam muito calmos, relaxados e bem dispostos, como nos confirmou Natália. E isso via-se no ritmo suave com que deslizavam pela superfície e até nos saltos e acrobacias. Tão suaves que pareciam pinceladas azuis sob as nuances cinzas e brancas das nuvens marítimas açorianas. Era toda uma dança que me transmitia um bem-estar enorme, no silêncio do mar. E o capitão Rodrigo soube deixar-nos viver estes momentos de contemplação, desligando o motor do barco enquanto esperávamos que os nossos “concorrentes” se afastassem e que os golfinhos se quisessem aproximar de nós.
Eu já estava a achar que ia ser difícil tê-los “para nós”, mas a Natália, que entretanto ia respondendo às minhas perguntas sobre os golfinhos, logo me animou a esperança: “Sim (há muitos barcos) mas há outro grupo de golfinhos que está a ficar aqui perto”. E dizendo isto apontou para a direcção que ficava nas nossas costas. Vimos logo vários golfinhos a saltar em grupo, cada vez mais próximos. “Preparem-se, tirem os coletes, coloquem as máscaras de snorkeling e sentem-se na borda do barco, com as mãos nas pegas e um pé de fora”. Tudo muito bem controlado. Não podíamos perder a oportunidade!… Primeiro o pai, depois o Arturzinho, seguidos de mim e do Luís.
Não vou mentir e dizer que não senti o coração a bater mais forte. Não só ia mergulhar em alto mar, como os meus filhos também. Mas é preciso perder os medos para entrar e aproveitar o momento. A Natália e o Rodrigo sabem-no bem. Mais do que instruir-nos, acalmou-nos: “Quando nós dissermos para entrarem, entrem logo, vai um atrás do outro, de seguida, e quanto aos meninos não se preocupem. Eu estou cá a vê-los e a tomar conta de tudo. Vocês mantenham a cabeça debaixo de água, senão, se ficam a olhar para as crianças, não vão ver nada…”. Foi muito importante ouvir isto. Todos os pais que me estão a ler podem entender o quanto é fundamental sabermos que os nossos filhos estão seguros. E estiveram-no sempre nesta aventura.
O primeiro mergulho
Com o barco parado, motor desligado e os golfinhos à nossa volta, a nossa equipa de bióloga e capitão deu a ordem: “É agora, entrem o mais rápida e suavemente possível, tentando deslizar e não saltar, para não afastar os golfinhos.” Dito isto, o Nuno entrou e, logo a seguir, vejo a Natália a pegar no Arturzinho e a fazê-lo deslizar para a água… Ai!… Lá foi ele, tão pequenino, para aquele mar tão grande! Mas nem tive tempo de ficar aflita, pois queria aproveitar e confiei no que me tinha sido dito: entrei logo. O Luís foi depois de mim, cumprindo o que tinha sido planeado.
Foi apenas a primeira tentativa e todos viram alguns golfinhos debaixo de água menos eu, que me pus a olhar à superfície. Este primeiro grupo afastou-se pouco depois e chamaram-nos de volta ao barco, que estava mesmo ao lado. Subimos facilmente a bordo e os miúdos estavam muito contentes. A mim aconselharam-me a ser mais rápida a olhar para dentro de água. Com toda a razão. O barco retomou a marcha, connosco sentados no flanco lateral como antes e, pouco depois, tornou a parar junto a mais golfinhos – não me perguntem como os nossos navegadores os conseguem localizar tão bem, mas o facto é que vêem o que nós não vemos.
Harmonia em tons de azul
Vencidos os receios do primeiro mergulho, desta vez entramos ainda mais determinados. Desta vez vimos um grupo muito maior, que se manteve visível durante mais tempo. Havia dois golfinhos a rodarem um sobre o outro – a namorar, disse-nos a nossa guia – e todos nadavam em conjunto. Uma visão impressionante! O azul da água, forte e límpido, realçava a pele clara dos golfinhos, que ganhava novos tons conforme se juntavam ou afastavam uns dos outros ou desciam e subiam, reflectindo as nervuras do sol na ondulação marítima. Já estávamos todos emocionados com a experiência, mas ainda não tinha acabado. Haveria ainda uma terceira vez, que seria a mais especial desta aventura.
Um grupo de golfinhos saltava de ambos os lados do nosso barco. Quase podíamos tocar-lhes. Só esta visão já nos enche, mas quando adentramos no oceano azul, com eles, há um mundo que se desvenda, uma e outra vez.
Um encontro frente a frente com um golfinho
O pequeno Artur teve a melhor surpresa de todas. Corajoso, deslizou para a água para viver uma experiência que nunca irá esquecer. Ao espreitar debaixo de água teve um pequeno susto (bom) quando viu que tinha um golfinho mesmo à sua frente, a olhá-lo nos olhos! “Estava tão perto que até lhe consegui ver a textura! E depois ainda ficou a olhar para mim de lado, antes de se afastar!”, conta o Artur que sentiu o seu coraçãozinho a bater muito e que na altura, diz, só conseguiu pensar: “isto é mesmo cool!”. Nós, que não tivemos um contacto tão próximo, vivemos através dele a emoção. E todos vimos um grande grupo de cerca de 30 golfinhos em harmonia, mesmo ao nosso lado. Desta vez, talvez por estarmos mais relaxados e sabermos agir melhor para aproveitar cada momento, conseguimos ouvir as vocalizações destes animais maravilhosos. Estaria o golfinho do Artur a contar aos outros que esteve tão perto de um menino que até lhe viu a textura da pele? Podia bem ser, pois os golfinhos têm uma linguagem própria riquíssima.
Como comunicam os golfinhos?
Sabemos que os golfinhos são verdadeiramente incríveis: além das suas conhecidas aptidões sociais, são seres inteligentes, ágeis e brincalhões que partilham muitas similaridades emocionais com os humanos. Para comunicar usam sinais vocais, sinais audíveis não vocais, sinais visuais e sinais tácteis. Os sinais vocais incluem os assobios, chilreios e gritos; os não vocais consistem em cliques, batimentos caudais e até estalidos sonoros, para disciplinar as crias e manter os tubarões afastados. Para se alimentarem, os golfinhos recorrem à ecolocalização, com um sonar que capta as ondas sonoras rebatidas pela presa e revela a sua localização, tamanho e forma. É um sistema comunicativo que beneficia o grupo: ao ouvir os cliques de ecolocalização de outros golfinhos, um golfinho forma no seu cérebro uma imagem mental do objecto que o seu amigo está a ecolocalizar. Há muito mais para saber sobre a comunicação entre golfinhos (vejam aqui) e sobre como funciona o seu cérebro (a ler aqui), mas agora tenho que voltar à minha história
Podemos acreditar que o Arturzinho provavelmente terá sido apresentado a todos os companheiros do seu amigo golfinho. O Luís ficou maravilhado por nadar com tantos golfinhos e orgulhoso por conseguir estar em alto mar sem colete. Comparadas com as fortes vagas de algumas praias açorianas que passara horas a desafiar com o irmão mais novo, a leve ondulação e a amena temperatura deste mar mais pareciam os de uma piscina.
O regresso
Colocados os coletes e vestidos os casacos impermeáveis, restava regressar, com a certeza de que tudo o que vivemos naquele espaço de tempo não poderia ter sido melhor. Ao aproximarmo-nos do pontão da marina de Ponta Delgada, mais uma surpresa: paralelo ao nossa barco, uma silhueta distinguia-se no ar. O Artur, seguro dos conhecimentos que ganhou com o seu jogo Animal Crossing, apontou logo: “Mãe olha, um peixe voador!”. Era mesmo – a Natália confirmou. Uma visão nada comum. Este singular peixe manteve-se a voar sobre a água durante mais de 10 segundos! Um final com chave-de-ouro, pois as memórias que ganhámos nesta manhã vão manter-nos nas nuvens durante muito tempo.
Quer nadar com golfinhos?
A Picos de Aventura é há muito uma empresa de animação turística de referência nos Açores com quase duas décadas de existência e um espírito de juventude inerente à sua filosofia: em mar e em terra, criam e reinventam experiências únicas de interação e em harmonia com a natureza, da forma o mais personalizada possível. As saídas para nadar com golfinhos fazem-se todo o ano, desde que as condições do mar o permitam.
A Picos organiza experiências nas Ilha de São Miguel e Terceira.
Para reservar uma experiência de natação com golfinhos vá ao site da Picos de Aventura.
Contactos telefónicos:
Ilha de S. Miguel +315 296 283 288
Ilha Terceira +351 918 377 926