Vera Dantas No Escritório De Adriano Ramos Pinto

Há uma marca portuguesa de Vinho do Porto cuja tentação nos alcança desde sempre pela imagem, mesmo antes de nos atingir no palato. Cartazes e rótulos em que até a Eva da criação se rende não à maçã, mas a um cálice de Porto estão-lhe no ADN. A marca alcançou tal importância e reconhecimento que a avenida onde está implantada a sua sede lhe tomou o nome: Ramos Pinto.

Com o Porto Envolto quero revelar e enaltecer as melhores marcas portuguesas e por isso fui conhecer a Casa Ramos Pinto. Esperava-me, para uma visita guiada muito especial, a directora de comunicação da Casa, Ana Filipa Correia. Contou-me que esta casa já tinha 200 anos quando foi comprada e remodelada por Adriano Ramos Pinto, que mudou a sua empresa para lá em 1909. Adriano tinha apenas 21 anos quando fundou a empresa, em 1880. Começou por conquistar o mercado brasileiro, enviando o vinho já engarrafado com a qualidade que o destacou da concorrência, e rapidamente se expandiu para a América do Sul, tornando-se responsável por metade do vinho exportado para essa região.

Homem profundamente artístico, membro do Círculo Artístico Portuense, Adriano quis marcar a diferença construindo um palácio para receber os seus clientes e encomendou todas as obras artísticas que nele se encontram. A área museológica, correspondente aos antigos escritórios. Logo à entrada em grandes painéis de azulejos, um grupo ninfas descansa bucolicamente num prado e, a seu lado, Baco deleita-se com os prazeres do vinho.

 

Paineis de Azulejos Casa Ramos Pinto

Ao centro dos balcões da antiga recepção, duas aberturas impelem-me a olhar: antevejo um espaço nobre e acolhedor, mas só ao entrar me apercebo da beleza destas instalações. Custa a acreditar que ainda há 15 anos este espaço funcionava como escritório e Ana, que tomou em mãos o projecto de musealização, conta que não foi fácil aos seus ocupantes deixarem as suas velhas secretárias!

Museu Casa Ramos Pinto

 

A grande sala em que me encontro agora, muito bem iluminada e decorada, é um testemunho valioso do percurso da Ramos Pinto e do bom gosto com que Adriano, um precursor do marketing, soube potenciar a sua marca. Sobre o balcão interior estão máquinas de escrever raras e belíssimas como uma Royal Barlock, e pela sala há engenhos de topo da época como uma fotocopiadora Gestetner Rotary Ciclostyle e uma calculadora mecânica, tudo em excelente estado de conservação.

As antigas secretárias em pau santo, que por si só já seriam para mim deleite, hoje em dia servem como mostruário da história dos vinhos Ramos Pinto. Nelas encontrei preciosidades como a garrafa de Vinho do Porto que Gago Coutinho e Sacadura Cabral levaram na sua lendária Travessia do Atlântico ou o Vinho do Porto Prelados, que Adriano conseguiu implementar como vinho de missa na América do Sul, África e Índia.

Vinho Do Porto Prelada

A grande qualidade do vinho e o cuidado no seu embalamento e promoção, com a criação de vinhos temáticos alusivos a figuras históricas, eventos ou instituições, acabaram por ser um alvo inevitável por parte de outras marcas, que plagiaram a marca Ramos Pinto. Achei especialmente caricata a marca “Vinho do Porto de Adrião”…

Plágios Da Marca Adriano Ramos Pinto

Mas Adriano soube ultrapassar essas tentativas através da sua sensibilidade artística que acabaria por imprimir um cunho inconfundível à marca. Para isso contratou artistas portugueses como o grande António Carneiro para criarem cartazes alusivos aos seus vinhos. Apesar da sua qualidade artística, faltava-lhes saber incarnar uma mensagem publicitária e essa foi a razão pela qual Adriano acabou por trabalhar apenas com cartezistas especializados estrangeiros como Leopoldo Metlicovitz, autor dos icónicos cartazes“Adão e Eva” e “Tentação de Santo Antão” ou René Vincent, criador da imagem “O Beijo” que já faz parte do nosso imaginário.

A visita segue então para o escritório do próprio Adriano, um espaço de luxo e bom gosto onde apetece ficar. E por momentos foi o que fiz, pois tive a oportunidade de me sentar no cadeirão de Adriano, ao lado do seu retrato, a apreciar um busto original de António Teixeira Lopes que guarda um tesouro ímpar. É que ao seu lado luz uma garrafa trabalhada com arte de joalheiro e que guarda um segredo. A Ana Correia retira a parte superior e, para minha surpresa, revela-me que no seu interior estão na verdade três garrafas, cada uma com uma variedade diferente de Vinho do Porto, pois era deste modo sofisticado que Adriano apresentava o seu néctar aos clientes e convidados.

Garrafa Tripla Casa Ramos Pinto

Ao lado, a divisão forrada a madeira contorna um vitral que testemunha o espírito satírico de Adriano, em que uma figura feminina ergue alto um cálice de vinho Ramos Pinto, abraçada por um fauno. De extrema delicadeza, foi concebido pelo atelier Picard & C. de Paris para uma exposição e posteriormente adaptado a esta casa. Rodeia-o um mostruário de algumas das mais célebres edições de Vinho do Porto Ramos Pinto.

Vitral Casa Ramos Pinto

A visita segue por fim para o local que fundamenta todo este negócio histórico: as caves. Além das pipas e barris, nela se encontra uma garrafeira única na história do Douro, uma verdadeira Enoteca. Nela estão a envelhecer garrafas provenientes do estudo de 12 variedades de uvas do Douro, vinificadas em Vinho do Porto e Vinho do Douro, resultado de um estudo sobre as castas região desenvolvido na década de 1970. O resultado culminou na selecção das cinco melhores castas do Douro para a produção de Vinhos do Porto e de Vinhos de Mesa, recomendadas pelo Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto (veja como visitar este também fabuloso espaço, aqui).

Garrafeira Enoteca Do Douro na Casa Ramos Pinto

 

Caves Ramos Pinto Em Gaia

Finalmente, a degustação. Nesta altura, quando Ana me oferece um cálice de Vinho do Porto Ramos Pinto Branco Reserva, sinto nas notas de sabor toda a história singular desta casa, repleta de imagens da arte nova à contemporaneidade. A Ramos Pinto é das poucas empresas que são produtoras das suas próprias uvas e por isso possui ainda quatro quintas no Douro, além do Museu de Ervamoira. Mas essa é outra história, que mais tarde vos irei contar…

Casa e Caves Ramos Pinto

Avenida Ramos Pinto, 380, Vila Nova de Gaia

Mais informações aqui

#VeraDantas #PortoEnvolto #Douro #VinhodoPorto #RamosPinto #Experiências #Gaia #Saborear